Em 1955, ou seja, há 70 anos, chegava às telas “Ladrão de Casaca”, dirigido por Sir
Alfred Hitchcock (1899-1980), cineasta inglês considerado por muitos críticos o mais
brilhante de todos os tempos. “Ladrão de Casaca” foi o terceiro de uma série de filmes
realizados por ele em cores e tendo Grace Kelly como protagonista. O primeiro foi
“Disque M para Matar” (1954), em que Grace tem de se livrar de um marido demoníaco
(Ray Milland) e de uma acusação de assassinato. O segundo, “Janela Indiscreta”
(também de 1954), um exercício de metalinguagem, isto é, um filme sobre a própria arte
do cinema, em que Grace e seu namorado (James Stewart) observam pela janela dos
fundos de um apartamento o que acontece no prédio em frente.
Dos três, “Janela Indiscreta” é provavelmente o filme de melhor recepção entre os
críticos. Mas “Ladrão de Casaca” talvez seja o mais célebre, e por vários motivos. Em
primeiro lugar, seu roteiro foi escrito por John Michael Hayes, tendo como referência o
romance homônimo de David Dodge, lançado em 1952. Além disso, há o enredo. Um
charmoso ladrão de joias aposentado (Cary Grant) tenta proteger sua reputação
enquanto corteja Frances (Grace Kelly). O cenário é a Riviera Francesa, no
departamento dos Alpes Marítimos, que tem cidades como Antibes, Cannes e Nice,
como também circunda o Principado de Mônaco. A fotografia é de Robert Burks,
ganhador do Oscar, e o figurino, da lendária Edith Head. Quanto à crítica, o realizador
francês François Truffaut escreveu que esse é um filme que satisfaz a todos os fãs de
Hitchcock, do mais esnobe ao mais simplório, talvez por ser a mais cínica de suas obras.
Em termos de bastidores, entretanto, “Ladrão de Casaca” supera e muito “Disque M
para Matar” ou “Janela Indiscreta”. Trata-se de 1955, ano da vigésima sétima cerimônia
de entrega dos prêmios da Academia, referente aos filmes de 1954. O evento ocorreu no
mês de março e, no que diz respeito ao Oscar de Melhor Atriz, foi considerado
surpreendente. Judy Garland havia recebido o Globo de Ouro de Atriz de Comédia e
Musical, por “Nasce uma Estrela”, e era a favorita para o Oscar. No entanto, a premiada
foi Grace Kelly, pelo bem menos atraente “Amar é Sofrer”.
Em abril daquele ano, Grace foi ao Festival de Cannes para promover “Amar é Sofrer”.
No mês seguinte, foi fotografada ao lado Príncipe Rainier III, de Mônaco. Ela era então
namorada do ator francês Jean-Pierre Aumont. Mas o encontro com Rainier foi
extremamente marcante. Após oito meses de relacionamento predominantemente à
distância o príncipe propôs casamento à atriz no Natal. Que ano para Grace Kelly:
Oscar de Melhor Atriz, lançamento de “Ladrão de Casaca” e noivado de conto de fadas.
“Ladrão de Casaca” foi o último filme de Grace com Hitchcock. Mas ele não perdeu a
esperança de voltar a trabalhar com ela. Em março de 1962, foi noticiado que a Princesa
teria aceitado estrelar o filme “Marnie”, a história de uma ladra loura com repulsa ao
sexo. No entanto, a repercussão do anúncio entre o povo de Mônaco foi péssima em
função da natureza do papel. Surpreenderia mesmo que uma Princesa aceitasse
protagonizar um filme tão mórbido e obsceno, que parecia até mesmo uma forma de
sadismo em relação à atriz principal. Ela então pediu ao diretor que adiasse a produção
do filme. Mas em junho daquele mesmo ano, Grace desistiu definitivamente de
“Marnie”.
E assim terminou a linda história do ano de 1955. Para Grace Kelly, Oscar e noivado
principesco. Para Hitchcock, apenas “Ladrão de Casaca”. Uma das mais famosas
colaborações da história do cinema saía de cartaz, deixando uma memória de
sofisticação e criatividade.