O prêmio de Melhor Ator no Festival de Cannes deste ano foi uma alegria, mas não uma surpresa para os admiradores de Wagner Moura. O filme “O Agente Secreto”, dirigido por Kleber Mendonça Filho, trouxe certamente um reconhecimento inédito para Moura. Contudo, desde 2015, com a série “Narcos” (2015 – 2017/Netflix), em que viveu Pablo Escobar, papel que lhe deu uma indicação do Globo de Ouro, ele vem construindo uma sólida carreira internacional. Em 2024, por exemplo, protagonizou, ao lado de Kirsten Dunst, o filme “Guerra Civil”, uma produção britânico-estadunidense dirigida por Alex Garland.
Baiano da capital, nascido em 1976, Wagner Moura, formado em Jornalismo pela Universidade Federal da Bahia, tem sido aplaudido pelo público e por seus colegas graças a suas notáveis características como ator. Ele se dedica extraordinariamente a seus personagens. Para “Narcos”, por exemplo, essa imersão profunda fez com que passasse por uma transformação física, ganhando peso para se adequar ao papel. É notoriamente carismático e intenso. E escolhe projetos significativos, não só em termos artísticos, mas também por questões sociais e políticas.
Acima de tudo, Wagner Moura é um ator versátil, indiscutivelmente habilidoso na representação do homem brasileiro. De seus muitos trabalhos três papéis revelam especialmente seu talento para mostrar as facetas da gente deste país: o Capitão Nascimento do filme “Tropa de Elite” (2007), Olavo da telenovela “Paraíso Tropical” (2007) e o Donato do filme “Praia do Futuro” (2014).
Uma complexa e estranha mistura de brutalidade e heroísmo marca o Capitão Nascimento de “Tropa de Elite” (Prime), dirigido por José Padilha. Ele é um tipo lamentavelmente convincente no cenário da violência metropolitana brasileira. Como de hábito, Moura investiu pesadamente na preparação do personagem, estabelecendo uma convivência com policiais do BOPE (Batalhão de Operações Policiais Especiais) para compreender a mentalidade desses profissionais.
Em “Paraíso Tropical” (Globoplay), criada por Gilberto Braga e Ricardo Linhares, Wagner Moura apresenta um homem cínico e inescrupuloso da elite carioca. Ele surge como o vilão da telenovela e, no entanto, vai se transformando num personagem extremamente sedutor e multifacetado graças à atuação sutil de Moura. Um destaque foi o envolvimento do executivo com a prostituta Bebel (Camila Pitanga), num encontro ao mesmo tempo passional, disfuncional e repleto de humor. É bem o retrato da tensão entre amor e sexo do brasileiro, que enverga uma postura machista, mas acaba demonstrando vulnerabilidade em relacionamentos pouco convencionais.
“Praia do Futuro” (Telecine), dirigido por Karim Aïnouz, tem Donato como protagonista, um salva-vidas de uma praia em Fortaleza, no Ceará. Aqui o trabalho de Wagner Moura é marcado pela introspecção. De homem forte e destemido, Donato passa a uma encruzilhada existencial ao se apaixonar pelo alemão Konrad, um homem que salvou do mar. A atuação de Moura explora a autodescoberta de Donato: fragilidade e vulnerabilidade por trás da figura do herói. A sexualidade do personagem é revelada pelo ator de forma original, distante do lugar comum. Principalmente por não ser um brasileiro típico, Donato, por meio da sensibilidade de Moura e de Aïnouz, faz pensar nos aspectos muitas vezes ignorados da vivência da masculinidade neste país.
Em 2021, Wagner Moura estreou como diretor, roteirista e produtor no filme “Marighella” (Telecine), um retrato do escritor e guerrilheiro baiano ambientado em 1969. Num período particularmente sombrio da história brasileira recente Moura afirmou sua perspectiva política sem medo de represálias. É um ator que vê o cinema como missão, para além da fama e da riqueza.