As máquinas artificialmente inteligentes conquistaram também o mundo cinematográfico. E não é de hoje. O exemplo de sucesso mais recente é o filme de animação “Robô Selvagem” (2024/Prime), escrito e dirigido por Chris Sanders e baseado nos livros de Peter Brown. Os robôs propriamente ditos povoam a nossa imaginação desde o início do século XX. A palavra “robô” vem do checo robota, que quer dizer trabalho forçado ou servidão, designando especificamente seres artificiais fabricados para servir aos humanos e executar tarefas automáticas que imitam suas ações.
A cultura pop tem convivido com diversos robôs. Não é possível falar de todos, mas certamente de alguns. Por exemplo, Rosie, a robô doméstica que cuida da casa futurista dos “Jetsons” (1962), uma série de animação produzida pelos estúdios Hanna-Barbera. A família Jetson, em 2062, vive a fantasia de um futuro idílico, bem de acordo com o imaginário daquela época, marcada pela Corrida Espacial. Rosie já é um modelo obsoleto, mas que jamais seria trocado pela família por uma máquina mais moderna. Ela faz o trabalho de casa e ainda atua como babá. É encantadora e feliz, como o sonho da automação doméstica.
Outro robô inesquecível é o B-9, de “Perdidos no Espaço”, tanto no original de 1965 quanto na versão exibida pela Netflix a partir de 2018. B-9 integra o núcleo da família Robinson e vai além de Rosie ao desenvolver um certo tipo de vínculo emocional com o caçula Will, a quem está sempre avisando acerca de perigos iminentes. E, no entanto, o futuro de “Perdidos no Espaço” já passou, pois a aventura original dos Robinson era ambientada em 1997.
O século XXI traz desafios diferentes para os robôs do cinema. Até porque eles estão cada vez mais presentes no cotidiano humano. Em 2003, estreia a animação distópica “Animatrix: A História Antes de Matrix” (Prime), uma coletânea de nove curtas-metragens dirigidos pelos maiores diretores de animê do mundo, cujos segmentos “A Segunda Renascença I e II”, escritos por Lilly e Lana Wachowski, apresentam robôs que, após alcançarem a consciência, são brutalmente oprimidos pelos humanos e se rebelam. De companheiros ou ferramentas, os robôs se tornam uma classe em luta pela libertação.
“Robô Selvagem”, entretanto, aponta para um outro tipo de transformação das máquinas inteligentes. Entra em cena Roz, uma robô de última geração que, por conta de um naufrágio, vai parar em uma ilha desabitada por humanos. Concebida para atender desejos alheios, ela se vê forçada a aprender a se comunicar com animais de outras espécies, que passariam a ser seus clientes. Nesse processo, Roz se aproxima de Astuto, uma raposa genial, que em inglês tem a voz inspiradíssima do ator Pedro Pascal, e adota um filhote de ganso órfão. Ou seja, tem de lidar com a improvisação e aprender novas linguagens, desenvolver habilidades sociais e encontrar a amizade e, num supremo esforço, conhecer a maternidade, justamente o impensável para uma máquina.
O filme de Chris Sanders é uma festa para os olhos. Cercada por animais extremamente solidários, Roz experimenta o colorido de cada uma das estações do ano. É no mínimo comovente essa integração de uma máquina com o planeta, para além das vicissitudes humanas. De Rosie a Roz, um salto evolutivo. De uma robô subserviente a uma robô que alcança a espontaneidade. E, ao mesmo tempo, da hierarquia homem-máquina, que pode mesmo levar à guerra, a passagem a uma visão ecológica da tecnologia.