Karl Mor
“Esperando o rabecão” (em espanhol: “Esperando la carroza”) é um filme cômico que encanta os argentinos há décadas. A obra, dirigida por Alejandro Doria (1936-2009) a partir da peça teatral do uruguaio Jacobo Lansgner (1927-2020), foi lançada em 1985. A trama de “Esperando o rabecão” (disponível no Prime Video) gira em torno de uma octogenária que é dada como morta pelos quatro filhos ao ser confundida com uma mulher que havia sido destroçada por um trem. O filme é um retrato cáustico da classe média baixa argentina. Tudo acontece em Versalles, um bairro periférico de Buenos Aires.
O elenco é especialmente afinado. Mas o destaque vai indiscutivelmente para a atrizuruguaia China Zorrilla (1922-2014), que é conhecida pelo público brasileiro por conta do filme “Elsa e Fred: um amor de paixão” (2005), escrito e dirigido por Marcos Carnevale (1963). Em “Esperando o rabecão”, China é Elvira, mulher de um dos filhos da octogenária e dona da casa onde transcorre a ação. Elvira é pérfida, dissimulada e sarcástica. Surpreende como China Zorrilla consegue expressar com tamanha maestria as variações de humor da personagem, passando da comédia rasgada à dicção melodramática ao sabor brilhante roteiro.
O filme de Alejandro Doria tornou-se um fenômeno na Argentina. Seus fãs marcam presença até hoje nas redes sociais. Chega a existir um passeio guiado para quem quiser conhecer a casa de Elvira em Versalles. E frases do filme transformaram-se em ditos populares no cotidiano argentino. O cinema da Argentina, que é conhecido predominantemente por obras dramáticas de forte apelo internacional, mostra em “Esperando o rabecão” um aspecto diferente. É um filme que os próprios argentinos gostam de ver e rever. Em torno dele, têm sido realizados festejos e eventos. É como se o público ao vê-lo se sentisse em casa. O país parece se reconhecer ironicamente nessa comédia amalucada. Para os brasileiros ela surge como uma oportunidade de descobrir gostosamente como os vizinhos riem de si mesmos.