Jhonatan Zati
Ao ler o romance “Ensaio sobre a Cegueira” (Companhia das Letras, 2008), do escritor português José Saramago (1922-2010), mergulhei em um universo de palavras tão poderosas que me senti envolvido em um turbilhão de emoções e reflexões.
Saramago constrói um mundo onde a cegueira repentina se espalha como uma epidemia, transformando a vida das pessoas em uma “treva branca”. No entanto, é nessa escuridão que a verdadeira essência da humanidade é revelada. Ela representa a cegueira coletiva diante das injustiças e da falta de empatia que assolam nossa sociedade.
O autor cria um cenário em que a verdadeira cegueira não está nos olhos, mas no coração e na mente daqueles que se recusam a enxergar a realidade. Assim, ele me fez, a todo tempo, estabelecer relações diretas entre os eventos simbólicos presentes na narrativa e acontecimentos históricos de nosso tempo, entre a nova ascensão do autoritarismo e a eclosão da denominada “pós-verdade”.
Em um cenário de guerra, os personagens do livro lutam para sobreviver em um mundo sem visão, explorando suas fraquezas e virtudes mais profundas. Nessa jornada, somos confrontados com o lado mais sombrio da natureza humana, onde prevalecem a ganância, a violência e a decadência moral, nos fazendo refletir sobre nosso mundo interior e exterior.
O estilo narrativo de Saramago se caracteriza por sua fluidez e ausência de pontuação convencional. As frases se estendem, se entrelaçam e se desdobram em um fluxo contínuo, criando um ritmo próprio e hipnótico, com sensibilidade e a profundidade emocional. Ele é capaz de explorar os sentimentos mais profundos e complexos de seus personagens, revelando suas angústias, alegrias e ferocidade. Em sua ficção, Saramago desperta em mim uma empatia genuína e uma conexão emocional com as histórias que ele conta.
“Ensaio sobre a Cegueira” é uma obra-prima da literatura que ecoa muito além das palavras. A prosa de Saramago é uma torrente literária, fluida e cativante, que me arrasta de maneira única para dentro de sua história.
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