“Não sou de nenhum partido, mas não me calo diante das injustiças.” Assim, o ator argentino Ricardo Darín define seu engajamento social. Um posicionamento que se comprova em todas as suas escolhas na carreira artística. Um exemplo é seu trabalho mais recente: “O Eternauta” (2025, Netflix), série de Bruno Stagnaro com segunda temporada confirmada, em que o personagem de Darín lidera um grupo que resiste a uma invasão alienígena.
Resistência, aliás, é uma palavra chave na trajetória de Ricardo Darín. Filho de pais atores e nascido em 16 de janeiro de 1957 em Buenos Aires, ele iniciou sua carreira nos palcos aos dez anos de idade. É pai do também ator Chino Darín. São, portanto, três gerações às voltas com a arte de representar. Embora internacionalmente reconhecido, Ricardo Darín não abre mão de sua ética pessoal e tem recusado papéis em Hollywood que considera estereotipados e fora de seus princípios artísticos, para permanecer prestigiando as produções latino-americanas. Dessa maneira resiste também ao lugar comum da indústria cinematográfica.
Filmes criteriosamente escolhidos tornaram Ricardo Darín um símbolo do cinema argentino contemporâneo. É o que se pode dizer de “Nove Rainhas” (2000, HBO-Max), um thriller policial escrito e dirigido por Fabián Bielinsk (1959-2006), e “Relatos Selvagens” (2014, HBO-Max), uma obra difícil de categorizar, pois conjuga comédia, sátira e absurdismo, e foi dirigida por Damián Szifron, e co-produzida pelos espanhóis Agustín Almodóvar e Pedro Almodóvar, contando com um elenco formado por atores de grande prestígio no país, como Oscar Martínez, Leonardo Sbaraglia e Érica Rivas.
Outro aspecto marcante da carreira cinematográfica de Ricardo Darín é sua colaboração com o diretor Juan José Campanella (1959). Juntos realizaram produções fundamentais da filmografia argentina. Um primeiro exemplo é “O Filho da Noiva” (2001, HBO-Max), um drama romântico também protagonizado pelos célebres atores Héctor Alterio e Norma Aleandro. Outro filme de extraordinário êxito da dupla Darín/Campanella foi “O Segredo de Seus Olhos” (2009, Prime), um drama histórico de suspense também estrelado pela talentosa Soledad Villamil (vista recentemente na minissérie “Cilada”, da Netflix), em que o relacionamento entre um agente judiciário e uma juíza é intercalado com a investigação de um caso de assassinato na década de 1970.
No que se refere à comédia, Darín expressa seu talento em filmes como “Um conto chinês” (2011, Disney+), de Sebastián Borensztein, uma divertida saga contra a xenofobia, e em “A odisseia dos tontos” (2019, Max), do mesmo diretor, sobre um grupo de moradores de uma pequena cidade que enfrenta a crise econômica argentina com a formação de uma cooperativa, com muito entusiasmo e equívocos.
A versatilidade de Ricardo Darín também pode ser comprovada no teatro, onde ele valoriza especialmente o contato direto com o público. A peça “Art”, de Yasmina Reza, foi um destaque em seu currículo durante quase dez anos. E desde 2013 Darín vive o protagonista de “Cenas da Vida Conjugal”, uma adaptação da obra de Ingmar Bergman, em que o ator tem tido a oportunidade de voltar a trabalhar com Norma Aleandro, diretora do espetáculo.
Embora seja devotado à arte, Ricardo Darín, acima de tudo, usa sua visibilidade para apoiar causas que considera justas. É voz ativa em questões sociais e defensor da memória histórica. Nesse sentido a atuação em “Argentina, 1985” (2022, Prime), dirigido por Santiago Mitre, em que é retratado o empenho do promotor que lidera o julgamento das juntas militares responsáveis pelos anos de chumbo do país, pode ser considerada uma extensão de suas convicções pessoais.
O ator Ricardo Darín adota uma posição política independente e se dedica à defesa do setor cultural argentino. Eis aí uma figura singular na cena latino-americana, em que tantos preferem apostar em conquistas meramente individuais e esquecer suas origens para se submeter aos ditames da indústria do entretenimento internacional. Darín mostra, portanto, que outro caminho é viável e provavelmente mais revelador.