Cesar Garcia Lima
O documentário não é novo, mas os motivos para vê-lo continuam atuais: o contraste entre o mundo em que vivemos e a busca espiritual segundo o ponto de vista de um personagem notável. “George Harrison: Living in the Material World” (2011, disponível no Curta!On), dirigido pelo nova-iorquino Martin Scorsese, aproveita o título do álbum do ex-beatle lançado em 1973 para empreender uma longa viagem pela personalidade do mais poético integrante do quarteto britânico. Realizado postumamente, o filme aborda desde o envolvimento do guitarrista com o LSD, a leitura dos mestres indianos até a amizade com Ravi Shankar, que se torna para ele uma espécie de preceptor da musicalidade oriental.
Originalmente produzido como quatro episódios e apresentado no streaming como filme de 3h28’, a narrativa é bastante irregular, o que não exclui sua capacidade de surpreender na riqueza de detalhes, incluindo várias entrevistas com os ex-beatles Paul McCartney e Ringo Starr, além de Eric Clapton, outro astro da música britânica, tão próximo de George que acabou se envolvendo com a mulher dele, Pattie Boyd.
O farto material de arquivo apresenta Harrison desde os tempos de Liverpool, onde nasceu em 1943, até próximo de sua morte de câncer em 2001, em Los Angeles, com entrevistas em aúdio e vídeo sobre sua participação nos Beatles, sua aversão à vida pública e o “salto” surpreendente do uso de drogas para a prática da meditação, incentivado pelo contato com o movimento Hare Krishna. Em um dos trechos mais chocantes, Olivia Harrison, viúva de George e uma das produtoras do filme, conta detalhes do brutal atentado a faca sofrido pelo marido e por ela em 1999.
Em uma sequência mais envolvente, ouvimos a interpretação de “While my Guitar Gently Weeps”, composição de Harrison, para o álbum branco dos Beatles, de 1968. Com o recente lançamento em português da biografia “George Harrison”, de Philip Norman, pela editora Belas-Letras, ver ou rever o documentário ilustra ainda mais a vida do compositor de “My Sweet Lord” e outras músicas que marcaram a inusitada parceria entre o rock e a devoção.