Karl Mor
Até hoje nenhum latino-americano ganhou o Oscar de Melhor Ator. Essa situação talvez mude na próxima premiação por causa do mais recente trabalho do mexicano Gael García Bernal: uma atuação que está despertando a atenção da crítica e do público. Trata-se do filme “Cassandro”, dirigido por Roger Ross Williams e lançado pela Amazon Prime Video.
Nesse drama biográfico, Bernal praticamente incorpora Cassandro, um astro exótico da luta livre. Mas, para além do nome artístico do lutador, ele é Saúl Armendáriz, que vive em El Paso, Texas (EUA), e cruza frequentemente a fronteira para lutar em Ciudad Juárez, no México. Incialmente esse personagem real, ainda em atividade, usa o codinome de El Topo (a toupeira), mas sai logo da toca para encarnar Cassandro. O filme tem algo de Manolo Caro, o neomelodramático diretor da série “A casa das flores”. Mas a comédia é breve. Predomina em “Cassandro” uma atmosfera tensa, no limite entre a vitória e a dor.
A paisagem de “Cassandro” é desolada, o que se poderia esperar de um filme ambientado na fronteira do México com os EUA. Além disso, o diretor Ross Williams vem do documentário e espetaculariza muito pouco o filme. São cenas lentas, muitas vezes com os personagens vistos de longe, na busca de uma estética original.
Pela luta livre e pelo exotismo, Saúl muda sua vida. Filho único de mãe solteira, rejeitado pelo pai, homossexual e sem o tipo físico típico de lutador, ele efetivamente enfrenta a vida com bravura. Saúl se torna Cassandro, a figura exótica que lhe dá fama, mas nem tudo se transforma. Persistem o ambiente árido da fronteira, a desolação familiar e o relacionamento extremamente difícil com o amante Gerardo (Raúl Castillo).
O grande mérito do filme é certamente a atuação de Gael García Bernal. Seria fácil cair na mera afetação ao interpretar Cassandro, mas Bernal lida de forma com extremo minimalismo em sua batalha pelo exotismo, sempre calmo e sorridente, sem nenhum recurso ao vitimismo. Por isso “Cassandro” é um filme que se vê com compaixão e serenidade, mas chegando mesmo a atingir o entretenimento.