Karl Mor
Comenta-se que a atriz Aubrey Plaza, da minissérie “White lotus” (HBO), protagonizará o próximo filme de John Waters, que tem como título provisório “Liarmouth” (algo ainda pior que “mentirosa”), o mesmo do livro lançado pelo cineasta em 2022, descrito por ele mesmo como “a feel-bad romance”, ou seja, uma obra que coloca o leitor em uma posição de intenso desconforto. Isso lembra bem filmes como os de Lars von Trier, Gus Van Sant ou Michael Haneke. Mas não. Waters, nascido em 1946 na cidade estadunidense de Baltimore, tem sua própria maneira de desconcertar o espectador. Tanto que Marsha Sprinkle, a protagonista da história, é apresentada brevemente como alguém que cães e crianças odeiam. O humor está no coração da arte de John Waters. Mas não se trata de um recurso convencional, bem comportado. Suas comédias são corrosivas. Querem mostrar o absurdo da sociedade contemporânea de uma forma inusitada, fazendo rir daquilo que o espectador médio mais teme.
Waters se celebrizou ao estabelecer uma parceria com sua conterrânea a atriz, drag queen e cantora Divine (1945-1988). Juntos realizaram a assim chamada Trilogia do Lixo: “Pink flamingos” (1972), “Female trouble” (1974) e “Desperate living” (1977). A tônica são personagens exagerados em situações ultrajantes. O sucesso de John Waters junto a um público maior veio em 1988 com “Hairspray – E éramos todos jovens”. É seu último filme com Divine, que morreu três semanas antes de seu lançamento. A comédia é ambientada na icônica Baltimore em 1962 e conta a história de uma adolescente fora do padrão que busca o estrelato como dançarina em um programa de televisão local e se rebela contra a segregação racial. O filme teve uma adaptação como musical da Broadway em 2002, que foi levada ao cinema em 2007 (“Hairspray – Em busca da fama”, dirigido por Adam Shankman). O filme mais recente de Waters é “Clube dos pervertidos”, de 2004. Novamente em Baltimore, uma comunidade suburbana se divide entre pessoas altamente conservadoras em relação à sexualidade e outras que se comportam como viciados em sexo. Passados vinte anos, a questão não poderia ser mais atual.